Despojamento de Poder
Basta-te minha graça, pois é na fraqueza que se revela totalmente a minha força (2 Cor 12,9)
O texto a seguir, de Dom Thomas Keating OCSO, foi publicado no número de junho de 2014 do boletim Contemplative Outreach News, e traduzido com autorização do autor para apresentação neste blog.
Dom Thomas Keating no Rio de Janeiro (2003) |
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O despojamento de poder é nosso maior tesouro. Embora tudo em nós queira superar essa condição, não devemos procurar fazer isto. A graça é suficiente para nós, mas não algo
que possamos compreender. Ter
muita pressa para se livrar de dificuldades é um erro, pois não sabemos como elas podem ser valiosas na
perspectiva de Deus. Sem elas talvez nossa transformação nunca seja tão profunda e tão completa.
Se tudo o mais falhar, a grande transformação se dará no processo
de nossa morte, quando tudo nos será retirado.
A viagem espiritual envolve a disposição de permitir que tudo o que possuímos nos seja tirado antes que o processo da
morte tenha início. Com isto adquirimos enorme valor diante de nós mesmos e dos outros, por termos nos antecipado à morte, que não é o fim mas o início da transformação completa. Quem passou pelo nascimento já atravessou um ensaio da morte, e seu corpo está bem preparado para a translação ou transição final, como muitos dizem. Não podemos ver Deus sem
passar pela morte, porque a intensidade de sua presença real nos queimaria, transformando-nos em poeira.
Durante sua vida
Jesus Cristo precisou esconder a
dignidade e o poder de sua natureza
divina. Um milagre
constante era necessário para esconder o fulgor e o poder de sua natureza interior. A única ocasião em que ela apareceu foi na Transfiguração, quando seu semblante brilhou e suas roupas ficaram mais brancas do que a neve. Esta foi a única ocasião em que a glória de sua
natureza divina pôde transparecer.
Cristo
escolhe sempre o lugar mais baixo. O mais baixo de todos. Por quê? Porque isto é o que Deus faz. Ele não se fixa em ser Deus, em receber elogios
e agradecimentos. Aquilo que o interessa é o nosso consentimento ao seu amor.
São Paulo foi
transformado pela comunicação que Deus lhe fez de Si mesmo, e por isso dizia: “Prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em
mim a força de Cristo. Eis porque sinto alegria nas fraquezas” (2 Cor 12, 9-10). Esta é a disposição que favorece a transformação. Ela não envolve grandes experiência
espirituais, mas a aceitação de nossas fraquezas humanas à
medida que se apresentem. Paulo assinalou, em seguida, no mesmo texto, suas outras dificuldades, como insultos, provações, perseguições, calamidades sofridas por amor a Cristo, concluindo: “quando me sinto fraco, então é que sou forte”. Quando chegamos a compreender isto, não precisamos de mais preparação.
Quando nos sentimos totalmente sem apoio, sem base, confusos, quando não temos lugar de pouso, e nos sentimos separados de Deus, alienados de Deus, estamos recebendo as disposições
que aparecem na Noite Escura graças ao imenso amor de Deus. Este é o modo pelo qual nossa natureza humana é condicionada pouco a pouco, a um ritmo apropriado para as possibilidades, vocação, personalidade e limitações de cada um. O processo é tão perfeito que nem poderia ser
colocado em uma categoria, como se fosse uma forma especializada de psicoterapia.
Deus nos conhece
profundamente e, mesmo assim, continua a nos amar
infinitamente. Sabemos, da biofísica, que enquanto nos apoia em nível fisiológico, o corpo tem de evoluir até certo nível para sustentar nossa inteligência e, ao mesmo tempo, ser sensível às comunicações divinas. Não estamos prontos para receber a formidável realidade de Deus sem uma preparação para a qual colaborem todos os elementos de nossa natureza
humana. Ele lida com os obstáculos em nós com extraordinária
gentileza, carinho, firmeza e paciência.
Se quisermos nos conhecer, devemos falar com Deus.
Ele sabe.
Finalmente, o despojamento de poder é o maior poder que existe, pois essa condição nos habilita a ser cada vez mais um canal para o poder e o amor de Deus – uma vez que o projeto que Ele acalenta para nós não tem propriamente em vista nosso engrandecimento ou perfeição.
O que desejamos realmente ser a esta altura de nossa vida e
viagem espiritual? A nossa meta é nos tornarmos santos? O problema com o desejo de santidade é que essa meta não é suficiente. Estaríamos optando por uma identidade de segunda mão. Suponhamos que você seja do Oriente: você desejará o Nirvana, a iluminação ou a grande
sabedoria de um Guru. Mas não importa como você vê a meta: é a Noite Escura
que é transformadora, porque é nela que nos percebemos despojados de poder.
Com o tempo nos sentiremos contentes com nossas fraquezas e felizes por sermos totalmente dependentes de Deus.
Neste ponto estaremos entrando no primeiro passo dos AA (Alcoólicos Anônimos) – que é, possivelmente, a mais brilhante sinopse da viagem
espiritual cristã existente. Qual é o primeiro passo? "Tomamos consciência de que nossa vida (qualquer que seja a adicção que nos aflige) tornou-se ingovernável". Quer dizer: não podemos fazer nada com ela. Esta é a disposição perfeita para a transformação. As Noites Escuras, nos conduzem até esse ponto; esta é a sua função. Embora sintamos algum desconforto, os inconvenientes experimentados são menores do que aqueles associados a alguma forma de adicção. Neste mergulho no abismo da bondade de Deus nossa única possessão é Sua infinita misericórdia. De que mais poderíamos precisar? Nada existe de maior.
Eis a minha base escritural: Em Mateus 10, 39 as seguintes palavras de Jesus são referidas: "Aquele que tentar salvar a sua vida, perdê-la-á. Aquele que a perder, por minha causa, reencontra-la-á". Eu interpreto esse versículo assim: "Aquele que tentar alcançar todas as coisas em que seu falso ser está interessado, atrairá para si a ruína. Mas aquele que se reduzir a nada por minha causa, descobrirá quem ele ou ela realmente é". E quem é realmente ele ou ela? Tudo. O "nada" acima referido não significa propriamente nada, mas "nenhuma coisa", nenhuma identidade fora de Deus. Ao tornar-se "nenhum objeto em particular," você se torna aquilo que Deus é – nenhum objeto em particular, mas tudo. Esta é uma atitude totalmente não possessiva em relação a si próprio.
Eis a minha base escritural: Em Mateus 10, 39 as seguintes palavras de Jesus são referidas: "Aquele que tentar salvar a sua vida, perdê-la-á. Aquele que a perder, por minha causa, reencontra-la-á". Eu interpreto esse versículo assim: "Aquele que tentar alcançar todas as coisas em que seu falso ser está interessado, atrairá para si a ruína. Mas aquele que se reduzir a nada por minha causa, descobrirá quem ele ou ela realmente é". E quem é realmente ele ou ela? Tudo. O "nada" acima referido não significa propriamente nada, mas "nenhuma coisa", nenhuma identidade fora de Deus. Ao tornar-se "nenhum objeto em particular," você se torna aquilo que Deus é – nenhum objeto em particular, mas tudo. Esta é uma atitude totalmente não possessiva em relação a si próprio.
Tradução de Maria Antonietta Garcia de Souza
Revisão e copidesque de Sérgio de Morais
[1] A Nuvem do Não Saber (autor anônimo) – Paulus Editora (1987) e Editora Vozes (2008)
Revisão e copidesque de Sérgio de Morais
[1] A Nuvem do Não Saber (autor anônimo) – Paulus Editora (1987) e Editora Vozes (2008)
[2] Intimidade com Deus (Thomas Keating) – Paulus Editora, 1999
[3] Mente Aberta, Coração Aberto – A Dimensão Contemplativa do Evangelho (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[4] O Mistério de Cristo (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[5] Convite ao Amor (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[6] A Condição Humana (Thomas Keating) – Editora Santuário, 2006
[3] Mente Aberta, Coração Aberto – A Dimensão Contemplativa do Evangelho (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[4] O Mistério de Cristo (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[5] Convite ao Amor (Thomas Keating) – Edições Loyola, 2005
[6] A Condição Humana (Thomas Keating) – Editora Santuário, 2006
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